IE no Trabalho

You can’t always get what you want. But if you try sometime, you’ll find. You get what you need. Você nem sempre consegue o que deseja. Mas se você tentar algum dia você encontrará. Você consegue o que precisa. (Mick Jagger – The Rolling Stones)

Incompletude. Esse é o sentimento remanescente após qualquer dia de trabalho, de acordo com o relato de meus clientes em sessões de coaching executivo ou em rodadas reflexivas, em oficinas e workshops de inteligência emocional. Existe no ar uma sensação de que não importa o quanto se trabalhe, não importa o quanto se organize: há sempre algo que ficou sem ser feito. Há sempre algum item na lista de tarefas que está pendendo há dias, quem sabe semanas. Sem falar nas demais dimensões da vida para as quais ficamos devendo: um pouco mais de exercício, uma alimentação mais saudável, um litro a mais de água, uma conversa mais assertiva e empática com aquela pessoa que nos importa. Algo ficou para trás.

Nesse artigo exploro um pouco o sentimento de incompletude, entendendo que associações ele tem com compulsões e cobranças internas pela hiper-realização, descobrindo ao final como podemos promover um bom autocontrole emocional e sermos pessoas produtivas e conectadas com nosso melhor self.

A incompletude abrange angústia ou desconforto com a situação e a sensação de que as intenções ou ações de alguém não foram concluídas de forma satisfatória; criticamente, ocorre na ausência de ameaça identificável. Summerfeldt et al., 2014

Um primeiro paralelo que podemos traçar é de que a incompletude pode ser motivadora de comportamentos compulsivos (Lu & Wu, 2019). A compulsão é um comportamento que promove alívio (geralmente temporário) de uma ansiedade ou angústia. (OCDUK, 2013-2022)

Isso tudo pode ser associada ao TOC e vamos a uma breve explicação disso. Por vezes, as compulsões são provocadas por pensamentos intrusivos, também conhecidos como “obsessivos” e isso pode significar a presença de um transtorno obsessivo-compulsivo, conhecido popularmente como TOC (em inglês, OCD). Porém o TOC, diagnosticável por psicólogos e psiquiatras, faz-se presente não apenas a partir do paralelo entre a obsessão (pensamento) e a compulsão (comportamento repetitivo para gerar alívio) mas também por outras características associadas (DSM, 2019); por exemplo, pensamentos que consomem o tempo da pessoa (mais de uma hora por dia) e significativo prejuízo à vida social e profissional.

Então a intenção aqui não é diagnosticar ninguém, mas sim nos fazer pensar se estamos tendo comportamentos que servem como fuga de sentimentos desconfortáveis e o quão lesiva pode ser essa atitude. Ainda, se estamos considerando que é PRECISO cumprir uma lista interminável de tarefas para que consideremos a nós mesmos como competentes e ativos. E afinal, talvez até mesmo EXISTA uma ameaça identificável, o que explicaria o MEDO de perdermos nossos empregos, de nos percebermos menos capazes ou de não sermos mais considerados profissionais sérios em nossa área de atuação (para citar alguns).

Há um segundo paralelo a se fazer na questão de incompletude, que é o sabotador interno hiper realizador. Nomeado pelo psicólogo Shirzad Chamine, o hiper realizador é extremamente valorizado pelas organizações, porém pode acabar com a saúde mental de quem o tem como dominante de seus pensamentos. Quando estamos sob influência desse sabotador, o único objetivo de nossa vida é alcançar realizações e produzir resultados. Torna-se preciso mostrar uma boa imagem e não podemos ceder a nossos sentimentos, que são uma distração. Nesse estado de espírito, a paz e a felicidade são fugazes e efêmeras, surgindo por alguns instantes como celebrações de conquistas. Até o próximo item da lista nos chamar a atenção e a cobrança interna recomeçar!

O terceiro e último paralelo tem a ver com a constante pressão existente no mundo organizacional em torno de metas de elevado desempenho e feedbacks contínuos, em que os hiper realizadores são não apenas valorizados, mas premiados. Tem a ver com a velha premissa de fazer “a qualquer custo”, sem preocupação com o “como”, na qual se espera que a conta da produção excessiva nunca chegue. A consequência disso é alto stress, clima organizacional péssimo, dificuldade de equilibrar a vida pessoal e profissional, todos os movimentos silenciosos do pós-pandemia (quiet quitting, silent firing) e uma constante falta de motivação e engajamento. Ninguém consegue viver sempre no limite, podendo toda essa equação resultar em doenças ocupacionais, depressão e desligamento.

Ou seja, na raiz do sentimento de incompletude está um desejo insatisfeito, uma ameaça que evitamos e uma meta de realização que nos consome e oprime. É então que o filósofo Jagger vem em nossa ajuda para dizer que não podemos ter tudo que desejamos!

O que seria então que precisamos?

E aqui reúno alguns princípios de inteligência emocional para clarear o raciocínio e nos trazer comportamentos adaptativos e intencionais. Tudo bem sermos pessoas que realizam e que são comprometidas com o desempenho. Mas nada bem fazermos isso à custa de bem-estar individual e das pessoas que nos cercam. Então se você, como muitos de nós, sente-se também “incompleto” ao final de um dia de trabalho eis algumas dicas para lidar com isso:

  • Leia seu contexto e planeje – Não caia no turbilhão de pedidos e entregas sem parar pelo menos alguns minutos do dia para organizar suas tarefas, tentando perceber ao longo dos dias o quão acuradas são suas previsões e, caso você superestime o que consegue fazer no tempo de um dia, realinhe seus objetivos.
  • Diminua as expectativas – a partir do hábito de planejar e organizar a rotina diária vai ficando mais fácil ter expectativas realistas, para seu próprio desempenho e das pessoas com que trabalha. E, ainda que a pressão por metas e resultados permaneça, será em primeiro lugar um acordo consigo mesmo(a) que servirá de apoio para as ações.
  • Valorize suas conquistas – Além da lista de tarefas feitas é importante finalizar cada dia considerando os pontos altos vividos, tanto na vida pessoal quanto profissional. Os sentimentos de gratidão e apreciação são ótimos aliados para vencer a incompletude e facilmente obtidos a partir da busca e manutenção de bons momentos e ações em nossa memória.
  • Medite para ganhar foco – Por último não há melhor dica para obtenção de foco atencional e limpeza de julgamentos e vieses cognitivos do que meditar brevemente todos os dias. Apenas 5 minutos podem ser um bom começo, não sendo necessário um completo isolamento para isso – músicas de relaxamento e alguma pausa mesmo que pós almoço já podem fazer o começo da prática ser possível.

Toda essa lista é mais bem apreciada se puder ser compartilhada com um profissional de desenvolvimento pessoal ou em sessões de autorreflexão.

Por último, além dessas dicas práticas convido a todos para seguirem nosso podcast Arena IE (disponível no You Tube da Conexão IE e Spotify), entendendo que nesse mês de fevereiro estamos justamente abordando o tema do Autocontrole Emocional! Quem sabe pode ser útil para aqueles momentos de análise pessoal e reposicionamento no trabalho.

Um excelente começo de ano pós-carnaval a todos nós, com realizações profissionais e muita inteligência emocional! 😊